Uma lagarta verde, de feições bélicas,
sempre andava por aquele jardim. Sim, era um jardim. Nada mais, nada menos: um
jardim. Um jardim com grama curta, bem cortada, mas, em contraste, belas flores
pareciam florescer ao natural. Flores roots,
incivilizadas, ou melhor, anti-civilizatórias. Devia ser por esse motivo ideológico,
do complexo cultural do grupo das flores anti, que a lagarta verde de feições bélicas
– que sempre andava por aquele jardim – era olhada de forma torta, enviezada,
carcomida. Devia ser por isso... Afinal, a lagarta verde – de feições bélicas –
era uma destas de assustar. Vocês sabiam que ela quando mordia lambia os beiços
e depois, displicentemente, tencionava a cabeça à esquerda? Além disso, o mais
irritante era que ela pousava as patas umas sobre as outras, demonstrando sua
superioridade diante do malgrado objeto de seu desprezo.
Eu sei que tudo isso parece muito
estranho. Também parecia para mim, até o dia em que, ao desligar as luzes de
natal do jardim, tomei uma baita mordida. Ela era assim, acreditem! Esnobe,
civilizatória, debochada e de feições bélicas. Era uma lagarta e tanto! Suas
decisões eram imediatas, sem frescor ou necessidade de esclarecimentos. Preto
no branco. Isso ou aquilo. E as flores roots
não gostavam dela. É verdade que o fato dela as comer pode ter alguma influência
neste julgamento. Talvez elas nem possam exprimir seu juízo, como partes
interessadas! É o que penso!
Neste tribunal de jardim, as
coisas funcionavam assim. Um dedo a mais, um dedo a menos, já não me importava –
naquela época – de ter mais dedos mordidos pela safada da lagarta verde – de feições
bélicas -. A safada verde, alargatada, um dia sem eira nem beira, sem explicações
ou circunstâncias, apareceu com uma nova sacada. Ela simplesmente subiu pela
mangueira do jardim e comeu um pedaço da porcaria da borrachada da mangueira.
Vocês imaginem a cena! Uma
lagarta verde – de feições bélicas – comendo uma mangueira. Isso nunca me havia
ocorrido e as pobres flores anti também não – é claro. Tamanha foi a surpresa
que as flores intervieram agressivamente: balançavam-se para um lado e para o
outro em legítimo protesto anti-civilizatório. Como diabos poderia uma lagarta
verde – de feições bélicas – morder e COMER uma mangueira de jardim de plástico?
Mas, queridos amigos, não sei em que medida o vento ajudou, mas vi com estes
olhos, que compõe meu rosto alerta, esta cena! E na medida em que a lagarta
mastigava era como se o tempo ficasse em flashes, câmera lenta, e muito do que
era natural se revelou e se desmanchou, como em um quadro de Salvador Dali. Derretidamente,
indiscetamente e até inadivertidamente, cada vez mais seres tomaram aquele
veneno visual para si, contorcendo-se internamente, inteiramente,
inadivertidamente.
Nenhum ser mortal gostaria de ver
aquela cena. E tão logo a lagarta verde – de feições bélicas – comeu o plástico
da mangueira a água jorrou. Jorrou. Jorrou. Jorrou a água. A água jorrou
sobremaneira. Imaginem! O quintal, o universo, parecia que tudo estava
enxaguado. Muita morte aconteceu. Formigas viram tsunamis. E até o cachorro
Bobby, de quem invejamos a imaginação, sucumbiu ao espanto.
Soube, de fontes preciosas, não
de água ou mangueira, que a lagarta verde – de feições bélicas, dirigiu-se em
um meio de transporte designa não oficialmente como jacaré, para um espaço
estranho, distinto, invulgar. Lá, defrontou-se com alguns caminhos. Não sabia
como voltar ao jardim, onde tudo começara. Pobre lagarta, pensei. Ela, por
outro lado, o que haveria pensado para atravessar linhas tão perigosas?
Dizem as más línguas – floridas línguas
– que a lagarta verde e humanizada (de feições confusas) nunca mais apareceu
por estas bandas.
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